Como lidar com pessoas difíceis – Sobre Chihuahuas e Akitas

Quando ministro palestras fora de meu país, grande parte das perguntas que as plateias fazem variam dependendo da cultura que estou lidando. Para mim, isso é de uma riqueza fantástica, pois posso compilar as perguntas e relacionar com os diversos traços culturais de cada uma das nacionalidades. Entretanto, uma pergunta sempre aparece, esteja eu no Rio de Janeiro ou em Marrakech: “Como lidar com pessoas difíceis?”.

 

Antes de começar a falar, gostaria de sugerir duas leituras básicas para vocês. A primeira é “People Styles at Work… and Beyond: Making Bad Relationships Good and Good Relationships Better” de Robert Bolton. Posso dizer que esse livro mudou minha vida. Ele foi indicado a mim por um presidente de uma grande rede de varejo sul-americana, durante um dos projetos mais desafiadores de consultoria que já passei. Desafiador não pela parte técnica, mas pela parte comportamental dos stakeholders. O segundo é “Start With Why” de Simon Sinek. Utilizamos este segundo o tempo inteiro na disciplina de Negociação dentro da pós-graduação do BBI of Chicago, pois nos ajuda a entender melhor como funciona o cérebro humano.

 

Por falar em cérebro humano, o que precisamos saber até agora é que ele possui três camadas básicas. Guardados os preciosismos técnicos, irei utilizar os nomes que Simon Sinek gosta de utilizar para nomear essas três dimensões: racional (camada mais externa), emocional (camada intermediária) e primitiva (camada mais interna).

 

Para sintetizar de outro modo, ao longo de milhões de anos de evolução humana, o núcleo do tronco cerebral, frequentemente chamado de cérebro reptiliano, foi superado e camadas de raciocínio mais sofisticadas foram acrescentadas sobre o mesmo para nos tornar mais inteligentes do que nossos “concorrentes” do reino animal.

 

Entretanto, o problema de lidarmos com pessoas difíceis reside exatamente aí: quando nos sentimos ameaçados, perdemos toda essa sofisticação humana, como se ela fosse desativada. Utilizamos o lado mais primitivo do nosso cérebro e perdemos o controle de nossas emoções. Quem nunca se sentiu perdendo o controle que atire a primeira pedra.

 

Desse modo, separei algumas dicas fundamentais que irão te ajudar a lidar com pessoas difíceis, evitando perder o controle de suas emoções e, consequentemente, o controle da negociação.

 

• Tenha empatia

Parece lugar comum ou frase feita, mas ter empatia muda a forma como você lida com as pessoas. Saiba que cada pessoa passa por batalhas pessoais que você dificilmente pode imaginar. Respeite o momento de vida de cada ser humano.

 

• Não leve nada para o lado pessoal

Nada desequilibra mais o ser humano do que uma discussão que envolva assuntos pessoais ou percepções sobre a sua pessoa.

 

• Não esboce reações enquanto a outra pessoa fala

Tenha certeza de que as pessoas desagradáveis muitas vezes sentem prazer em desequilibrar a outra pessoa. Jamais demonstre que aquela frase ou aquela palavra o desagradou. Ouça tudo o que a pessoa tem a falar, sem demonstrar reação nem interromper.

 

• Tenha certeza que você se faz entendido

Pessoas difíceis geralmente possuem dificuldade de praticar a escuta ativa. Trabalhe ponto por ponto, um de cada vez. Sintetize e sumarize de forma constante, para se certificar que tudo o que você está falando está sendo entendido.

 

• O óbvio deve ser dito

Muitas vezes existem uma série de barreiras na comunicação, tais como gap de gerações ou gaps técnicos. O óbvio deve sempre ser dito.

 

• Tempo

Todo mundo já acompanhou uma partida de futebol onde o clima está tão tenso em campo que alguém fala: “Tem que acabar logo o primeiro tempo para dar uma esfriada”. Sim, o tempo é um fator que ajuda a lidar com pessoas difíceis. Em negociações com alto índice de entropia, nada melhor do que pausas estratégicas para esfriar e acalmar o ambiente. Mas lembre-se sempre de sintetizar e resumir os pontos tratados antes de sair e ao voltar das pausas, para ter certeza que todos estão na mesma página.

 

São seis dicas que, se bem cumpridas, podem mudar a forma como você lida com pessoas difíceis. Para ter ideia de como levo isso a sério, tenho guardado comigo essas seis dicas em um cartão na minha carteira, para jamais esquecer.

 

E, por falar em esquecer, quero concluir contando sobre um aprendizado que jamais saiu da minha memória. Essa história aconteceu em Rishikesh, na Índia, cidade que se tornou mundialmente conhecida por ser o refúgio espiritual dos The Beatles. Lá, um guru, que infelizmente não me recordo o nome, deu-me uma das mais preciosas dicas, que levo para vida. Chega a ser engraçado o exemplo dele, mas é de extrema valia.

 

“Quando se deparar com pessoas difíceis, imagine que essa pessoa tem um Chihuahua dentro de si. É um cachorro pequeno, mas muito, muito nervoso. Se você também tiver um Chihuahua dentro de você, assim que o cachorro do seu amigo começar a latir o seu irá reagir e ninguém resolverá nada. Não tenha um Chihuahua dentro de si, tenha um Akita. Ele irá deixar o Chihuahua latir até se cansar e saberá agir no momento certo.”

 

Parece besteira, mas toda vez que me deparo com uma situação dessas, repito para mim: “Você não tem um Chihuahua, você tem uma Akita. Deixe ele latir, pois irá se cansar”.

 

Rodrigo Lang, sócio-fundador do BBI of Chicago.

Foi fundador de um dos maiores grupos de educação do Brasil no início dos anos 2000.

Com vasta experiência em consultoria em mais de 30 países, Lang desenvolveu uma das metodologias consideradas referência no mundo da negociação.