Como Suprimentos se Tornou Estratégico? E Quais as Limitações para que Isso Aconteça?

Ultimamente, algumas pessoas me perguntaram sobre questões interessantes que surgem nos treinamentos que ministro sobre supply-chain. Resolvi, então, investir um tempo para compartilhar algumas dessas experiências neste canal.

 

Um bom tema para começar – e não por acaso é algo que sempre abordo na introdução de qualquer curso – é: para início de conversa, precisamos entender porque faz algum sentido falar ou ler sobre supply-chain, também conhecidos como suprimentos.

 

Pois bem, quem é da área sabe, ouviu falar ou vive no dia a dia a ideia de que Suprimentos passou a ser algo estratégico, e que o cabeça da área passou a sentar em uma cadeira que está cada vez mais no topo da pirâmide hierárquica das organizações, seja como CPO (chief procurement office), head of procurement ou supply-chain, vice-presidente, diretor executivo ou qualquer outro nome que essa posição tenha dentro da empresa.

 

A questão então é (ou são): como isso aconteceu? E hoje, quais as limitações para que isso ocorra mais rapidamente?

 

Para responder à primeira pergunta, vamos passar quase cem anos de história em alguns parágrafos. Um bom indício de que a atividade de “compras” passou a ter alguém dedicado e com atividades estruturadas e específicas dentro de uma organização é o surgimento do primeiro curso de Compras em Harvard, que data de 1917. De então até a década de sessenta, o tal “comprador” era um mero colocador de pedidos de compra do que lhe era pedido, cuidando simplesmente de que o preço fosse aceitável. A evolução que ocorreu no período foi devido às duas grandes guerras, que trouxeram mais atenção à atividade devido a escassez de materiais e a variação de preços.

 

Já na década de 70, com as crises do petróleo e a falta generalizada de matérias primas, não bastava mais procurar onde comprar e pagar o preço que se pedia. Por mais que se tivesse verba para comprar, o que era necessário simplesmente não estava disponível. O planejamento de materiais passou a ser algo estratégico nas empresas, e com isso se ligou um foco a mais no comprador.

 

Na década de oitenta, o mundo acadêmico refletiu sobre o que vinha acontecendo. O grande marco é 1983, com a publicação de “Purchasing Must Become Supply Management”, de Peter Kraljic, pela Harvard Business Review. O aparecimento do “just in time” e a ênfase em controle de inventário, qualidade, quantidade e entrega do fornecedor fez compras deixar de ser simplesmente compras e passar a se aproximar mais da estratégia competitiva dos negócios.

 

Na década de 1990, as empresas já haviam interiorizado esses conceitos e o termo “supply chain management” já substituía, em muitas organizações, os termos “compras,” “logística” e “operações”.

 

E então chegamos aos anos 2000, mais notadamente em 2008, quando aumentou ainda mais a busca por redução de custo, eficiência e fazer mais por menos, deixando a área de compras, ou suprimentos, mais em evidência ainda. Neste momento as altas gerências se atentaram ao fato de que a função de Suprimentos, exercida por um grupo relativamente pequeno de pessoas dentro da organização, mexia com boa parte do custo da empresa, e com isso acabava contribuindo com milhões no seu resultado final.

 

Ora, cada centavo economizado por Suprimentos é um centavo a mais direto no resultado da empresa. O benefício financeiro que a área traz é facilmente mensurável, enquanto a contribuição de outras áreas é mais difícil de se tangibilizar.

 

Além disso, muitas das informações necessárias para a tomada de decisão dentro de uma empresa estão na mesa do CPO, e ele conhece a organização de maneira transversal. Quem são nossos principais parceiros? De onde vêm os principais problemas que afetam a qualidade? É melhor comprar, alugar, produzir dentro de casa ou terceirizar? Quem é que está gastando o que, onde e com quem? Quais são as metas que cada área visa quando precisa contratar um material ou um serviço, e como podemos traduzir isso nos modelos de contratação? O importante é que o CPO saiba como relacionar e interpretar essas informações, gerando informação estratégica para a tomada de decisão.

 

Uma vez visto isso, voltemo-nos para a segunda pergunta: e hoje, quais as limitações para que isso ocorra mais rapidamente? Vou me resumir a dois pontos. O primeiro é que muitas vezes quem hoje está no topo das organizações são profissionais que estão há décadas em suas carreiras e que, no tempo em que estavam em níveis mais operacionais, viam em suas organizações áreas de compras que não tinham nada de estratégico, com aquele antigo comprador “passador de pedidos”. Portanto, esses altos executivos muitas vezes não chamam o novo CPO a participar da estratégia da organização e não se dão conta do benefício que teriam ao fazê-lo.

 

A segunda limitação é o próprio perfil histórico do profissional da área. É difícil – para não dizer impossível – você ver alguma criança dizendo que quer ser comprador quando crescer ou algum estudante – salvo raras exceções – dizendo que quer ir para a área de suprimentos para ter uma carreira mais agressiva e vertical em uma organização. Em outras palavras, os profissionais mais bem preparados e capacitados não vão com muita frequência, de forma natural e fluída, à área de supply-chain. Isso faz com que, às vezes, quando o CPO é chamado a participar da estratégia, ele não tem o perfil adequado, não está preparado e não consegue agregar.

 

Para finalizar, deixo aqui o perfil que é visto como ideal para um CPO moderno, aquele que se senta junto aos tomadores de decisão e contribui na estratégia da empresa: essa pessoa entende o que as diferentes áreas da empresa precisam e querem, consegue identificar no mercado a melhor solução para a empresa e consegue “vender” essa solução aos seus clientes internos. Isto é, esse profissional precisa ter os hard-skills de entender em detalhe as especificações de produto e escopo de serviços que a empresa precisa, entender o que o mercado oferece e quais as diferenças entre os principais players, mas também precisa de soft-skills de relacionamento e comunicação para liderar e influenciar a aceitação e tomada de decisão em cima do que ele observou.

 

E você, meu colega, o que você acha que são as habilidades necessárias a um bom CPO?