No atual ambiente econômico, caracterizado pela volatilidade e incertezas trazidas por eventos como a pandemia de covid-19, a guerra na Ucrânia e os rompimentos nas cadeias de suprimento, a estabilidade financeira das organizações é constantemente testada. Nesse contexto, a modelagem financeira desempenha um papel essencial para ajudar as empresas a enfrentarem os desafios do presente e construírem um futuro sustentável.
No entanto, a modelagem financeira tradicional, focada exclusivamente em aspectos contábeis e financeiros, não é mais suficiente. Para que as organizações prosperem em um cenário de longo prazo, é fundamental que incorporem uma abordagem ESG (Environmental, Social and Governance) em sua modelagem financeira. Essa abordagem considera não apenas os riscos financeiros, mas também os riscos ambientais, sociais e de governança, bem como as oportunidades trazidas pelas práticas sustentáveis.
Um período de relativa estabilidade para a economia mundial terminou com o início da pandemia de covid-19, e choques adicionais testaram a estabilidade da indústria no início da guerra na Ucrânia, seguida por interrupções na cadeia de suprimentos e um aumento nas tensões geopolíticas.
Conforme relatado pelo Fórum Econômico Mundial em seu Relatório de Riscos Globais de 2023, as baixas taxas de juros e o acesso a dívidas baratas acabaram. Entramos em uma nova era macroeconômica caracterizada por baixo crescimento, baixos investimentos e baixos níveis de cooperação. Agora, as organizações devem lidar com pressões inflacionárias, subida de juros, normalização rápida das políticas monetárias e crescente fragmentação.
As três tendências atuais incluem a revolução tecnológica, a agenda de sustentabilidade e a tensão geopolítica, que exigem compromissos renovados, estratégia mais inteligente e maior agilidade.
Sustentabilidade tornou-se um imperativo estratégico para as organizações, à medida que seus modelos de negócio foram sendo desafiados por temas sociais e ambientais. As organizações devem estabelecer uma distinção clara entre aquelas que abordarão a sustentabilidade como uma tarefa orientada ao cumprimento da legislação e as que a tratarão como parte do seu propósito e estratégia.
O processo de modelagem financeira é uma jornada interativa que busca fornecer uma visão preditiva de como a empresa pode gerar valor ao longo do tempo. É fundamental identificar e quantificar as diferentes fontes de valor, tanto tangíveis como intangíveis. Essas fontes podem incluir melhorias na eficiência operacional, crescimento do mercado, inovação de produtos e serviços, vantagens competitivas e muito mais. Através dessa análise, podemos entender melhor a dinâmica financeira da organização, permitindo decisões estratégicas e otimização de recursos.
Os objetivos da modelagem financeira são multifacetados, mas destacam- se principalmente: a criação de projeções financeiras confiáveis, a identificação de oportunidades de crescimento e a avaliação de riscos associados aos investimentos. Uma das melhores práticas em modelagem financeira é criar cenários diferentes que levem em consideração variáveis macroeconômicas e fatores ambientais e sociais. Essa abordagem permite uma análise mais abrangente, considerando incertezas e riscos potenciais. Ao explorar diferentes cenários, podemos avaliar a sensibilidade dos resultados financeiros às mudanças nas condições de mercado e tomar decisões mais informadas.
Agir proativamente diante de cenários adversos é crucial para a sustentabilidade dos negócios. A modelagem financeira, quando incorpora a análise de cenários adversos, permite que as organizações antecipem os possíveis impactos negativos e adotem medidas preventivas. Por exemplo, ao considerar a possibilidade de desastres naturais decorrentes das mudanças climáticas, as empresas podem desenvolver estratégias de mitigação de riscos e adaptação, garantindo a continuidade de suas operações e a preservação do valor para os acionistas.
No âmbito das oportunidades, a transição para uma economia de baixo carbono pode trazer desafios para as empresas dependentes de combustíveis fósseis, mas também abre espaço para oportunidades em setores como energias renováveis e eficiência energética.
Essas mudanças mexem com os direcionadores de valor a longo prazo, afetam suas perspectivas de desempenho financeiro e definem novas condições para suas estruturas de divulgação de sustentabilidade, que precisam ser aprimoradas para que as organizações consigam reportar como estão reagindo a esses desafios, fornecendo informações mais transparentes e confiáveis para clientes, reguladores e investidores globalmente.
A importância da modelagem financeira na perspectiva de ESG é fundamental para o desenvolvimento e perenidade dos negócios, por meio da gestão de riscos e oportunidades. No passado, as organizações se concentravam exclusivamente na geração de lucros para acionistas, conforme proposto pelo economista Milton Friedman, em 1960, no chamado modelo do acionista (shareholder model).
No entanto, as empresas evoluíram para o conceito de geração de valor compartilhado, levando em consideração todos os stakeholders envolvidos (stakeholder model). Esse modelo, introduzido por Edward Freeman em 1984, reconhece a importância de atender às necessidades das comunidades, preservar o meio ambiente e contribuir para a sociedade como um todo.
Nesse contexto, a perspectiva de ESG na modelagem financeira busca garantir a criação de políticas, produtos e tomada de decisões éticas em todos os níveis da organização. Trabalhar sob a perspectiva de ESG vai além do cumprimento da lei, envolvendo uma abordagem diligente para antecipar e mitigar impactos negativos.
A devida diligência consiste em desenvolver mecanismos de monitoramento e transparência que permitam identificar potenciais danos e agir para evitá-los ou repará-los. Isso inclui não apenas as atividades diretamente relacionadas à sede da empresa, mas também toda a cadeia de suprimentos e atividades associadas.
Sabe-se que lucros podem ser obtidos por meio de ações ilegais ou imorais, o que pode gerar passivos tanto tangíveis quanto intangíveis no futuro das organizações.
Existem diversas práticas que podem gerar lucros no curto prazo, mas que acarretam passivos no longo prazo. Por exemplo, sonegação fiscal, corrupção, contratação de mão de obra em condições precárias e participação em cartéis. Essas práticas violam a ética e comprometem a boa governança. Ainda, muitas empresas estruturam programas de remuneração baseados em metas de curto prazo, o que pode incentivar gestores a adotarem práticas danosas para a empresa e para a sociedade.
Portanto, a modelagem financeira é uma ferramenta poderosa que ajuda as organizações a tomar decisões estratégicas mais embasadas. Ao considerar os fatores ESG, podemos criar modelos que levam em conta não apenas as dimensões financeiras, mas também a sustentabilidade e o impacto socioambiental. Com uma modelagem financeira robusta, podemos otimizar o uso de recursos, mitigar riscos e alcançar resultados financeiros sustentáveis para a organização e seus stakeholders.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
SCHUR, Rafael. A Importância do Tema Sustentabilidade no Setor Financeiro. EY, 2023. Disponível em: https://www.ey.com/pt_br/financial- services/reporte-sustentabilidade-brasil. Acesso em: 25 de set. 2023.